UM NARIZ CHAMADO GEOFREDO – Estória


Nos arredores de uma cidade, numa pequena casa construída em pedra à face da estrada, vivia um nariz muito grande e gordo. Chamava-se Geofredo.

Ninguém gostava dele, porque o achavam muito feio. Quando as crianças da escola passavam pela sua casa e o viam à janela, chamavam-lhe narigão, penca ou batata, e iam-se embora rindo à gargalhada.

Geofredo vivia sozinho e triste. O seu sonho era pertencer a uma cara. Como ele gostaria de pertencer a uma cara simpática!

Então, um belo dia, resolveu sair à rua à procura de uma cara sem nariz…

Passeou pelas ruas da cidade, observando todas as pessoas que por ele passavam. Mas… que grande desilusão! Todas as caras que passavam na rua já tinham nariz; e imagina tu que a maior parte deles até eram bem mais bonitos e elegantes do que ele próprio…

Voltou para casa muito desiludido, o pobre Geofredo.

Ligou a televisão para ver os desenhos animados. No intervalo, passaram propaganda sobre as páginas amarelas da lista telefónica. “É isso!”, pensou. “Talvez eu encontre a minha cara através das páginas amarelas!”

Consultou as páginas amarelas, na esperança de resolver o seu problema. Procurou em cara, testa, sobrancelhas, olhos, nariz, bochechas, boca… Mas… nada! Afinal de contas, as páginas amarelas também não podiam ajudá-lo.

Resolveu consultar as informações telefónicas. Pegou no telefone, marcou o 180 e esperou:

Trrimm… Trrimm…

– Informações!

– Minha senhora, muito bom dia! Seria possível informar-me onde posso encontrar uma cara sem nariz?

– Sabe a morada?

– Que morada?!

– A morada da cara que procura!

– Não, não sei!

– Então ligue para o 118.

– Obrigado!

Trrimm… Trrimm…

– Informações!

– Minha senhora, pode ter a gentileza de me informar onde posso encontrar uma cara?

– Uma cara. Ora vejamos, qual o nome completo?

– O meu nome?

– Não, senhor, o da tal cara!

– Ah, o da cara?! A senhora sabe, é que eu tenho um problema…

– Tem um problema? Então será melhor ligar para as avarias! Faça o favor de desligar e marcar o 188.

Geofredo ligou então o 188:

– Avarias!

– Bom dia, minha senhora, eu tenho um problema. Sabe…

– Um problema?! Qual o número do seu telefone?

– O número do meu telefone é o 1231853.

– 1231853?

– Sim!

– Muito bem, amanhã, o técnico dos telefones irá arranjar-lhe a avaria.

– Sim, mas…

Pobre Geofredo!… A telefonista tinha desligado sem que ele tivesse tido tempo para explicar à simpática senhora qual era o seu problema…

Sentia-se tão só e tão triste! Como haveria ele de encontrar uma cara? Se ainda pelo menos não fosse tão grande e gordo! Talvez pudesse pôr um anúncio no jornal:

“Nariz, elegante, pequenino e prático, oferece-se para colocação em cara estável e simpática. Assunto sério e urgente!!”

Talvez então alguém o quisesse, quem sabe?…

Era isso! Tinha de se tornar mais elegante e, se possível, diminuir um pouco…

Pensou em consultar um médico. De narizes, está claro!

– Ora diga lá, de que se queixa? Tem dores? – perguntou-lhe o médico de narizes.

– Não, senhor doutor. Dores não tenho! Só que eu gostava de ser um tanto mais pequeno e de preferência perder também umas gramas, para poder encontrar uma cara que me quisesse.

– Ó meu caro nariz!  Se esse é o seu problema, o melhor será pedir ajuda a um escultor.

–  Um escultor?! Mas o que é um escultor?

– Um escultor é um artista que trabalha certos materiais como o barro, o gesso, a pedra, o bronze, o ferro, a madeira… e, de todos esses materiais sem forma, ele cria tudo o que a imaginação lhe oferece, ou reproduz o que vê. Por exemplo, a figura de uma pessoa, de um animal ou de um objeto.

Geofredo alegrou-se por ter ficado a saber o que era um escultor. E ainda mais por ter descoberto que existia alguém capaz de o ajudar. Por isso, foi todo feliz e a correr a casa de um escultor…

Truz, truz, truz…

– Quem é? – perguntou uma voz um tanto rouca e forte.

– Geofredo!

Um homem alto e magro, de cachimbo na boca e boné às riscas, abriu a porta.

Era o escultor!

– Oh!… Então, diz lá, que queres tu?!…

Geofredo hesitou, vendo o olhar de análise do escultor. Por fim, disse ainda com um certo receio:

– Eu tenho um problema…

E contou ao escultor a triste história da sua solitária existência.

– Pois meu amigo – respondeu-lhe o escultor depois de o ter escutado atentamente –, o teu problema é fácil de resolver. Entra!…

Geofredo entrou, e que viu? Tantas estátuas… e todas elas sem nariz!

– Como vês, tens muito por onde escolher – disse o escultor.

– Mas por que razão é que as estátuas não têm nariz?! – perguntou Geofredo muito admirado.

– Ainda não têm, mas vão ter! Só que eu preciso de um certo tempo para dar o nariz certo a cada estátua. Sabes que um nariz, numa cara, é uma coisa importantíssima. Porque o nariz dá a personalidade ao rosto. É o mesmo que dizer: mostra como ele é por dentro, como ele sente, como ele vê os outros…

– Mas que interessante! Eu nunca pensei que uma estátua pudesse pensar ou sentir…

– Tudo o que é criado com Amor, como um artista cria a sua obra, tem vida. E tudo o que tem vida tem a sua forma própria de sentir e de existir. Só que nós nem sempre somos capazes de entender a sua linguagem…

Mas, anda, vamos procurar o rosto ao qual tu vais dar uma personalidade.

Geofredo passeou durante algum tempo pela sala de trabalho do escultor. Observava todas as estátuas com narinas muito grandes de admiração. Eram bonitas as estátuas!… E todas elas sem nariz! Mas, qual delas escolher? Como é difícil, por vezes, tomar uma decisão…

– Então, já encontraste a tua cara? – perguntou o escultor.

– Hum!… Não sei. Ainda não sei…

– Bem, vou ajudar-te.

O escultor saiu por uns momentos e voltou com um grande espelho.

– Então, que tal? Podes observar-te no espelho. Talvez te ajude a decidir…

– Ah!! – exclamava Geofredo enquanto se observava. Era bom ver-se ao espelho!…

E, arrebitando as narinas de vaidade, pensava que afinal não era assim tão feio! Então, a batatinha que ficava mesmo por cima das suas grandes narinas, tornava-se toda rosada de alegria…

– Senhor escultor – disse ele, finalmente –, acho que um nariz como eu merece pertencer à cara mais importante que o senhor tiver esculpido.

O escultor riu e concordou.

Assim, Geofredo foi colocado no rosto da estátua do fundador da cidade onde viviam. Tinha sido um homem muito importante e morrera havia muito tempo. Em sua homenagem a estátua foi colocada no centro da praça principal da cidade.

Como ficava bonito Geofredo naquela cara! E que feliz ele ficava quando os habitantes da cidade, passeando pela praça e olhando para a estátua, diziam:

–  Mas que maravilha! É mesmo uma grande obra de arte! E o nariz está formidável, mostra bem a personalidade de um grande homem…

Geofredo corava de alegria!…

… E o escultor, que o observava a um canto, piscava-lhe o olho e sorria…


D. Momo King

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